terça-feira, 4 de outubro de 2011

Ah, se fosse fácil... Mesmo com câmbio favorável e mercado lá fora, os empresários brasileiros não conseguem exportar




Embraer: foco no exterior colocou a empresa entre as quatro maiores fabricantes de aviões do mundo

No mesmo período em que vários países emergentes promoveram saltos extraordinários em suas exportações, o Brasil marcou passo. Na última década, a China quadruplicou suas exportações. O México triplicou as vendas externas embalado pela adesão ao Nafta, área de livre comércio da América do Norte. No Chile, o volume exportado duplicou, o mesmo ocorrendo com a Tailândia, um país pobre do Sudeste Asiático. O Brasil avançou 55%. Os números ficam ainda mais tímidos quando se examina a participação do país no bolo total do comércio mundial. No começo da década de 90, o Brasil tinha uma fatia de 0,91%. Já era pouco para a oitava economia do mundo. Pois ela ficou ainda menor. No final da mesma década, havia caído para 0,86%. Na semana passada, mais um responsável pela área das vendas externas, o ministro do Desenvolvimento, Alcides Tápias, despediu-se do cargo sem que tivesse conseguido melhorar a curva das exportações.
Não por defeito do ministro. Na iniciativa privada, Tápias comandou com competência gigantes como o Bradesco e a construtora Camargo Corrêa, mas no governo não conseguiu alavancar as exportações nem tirar da gaveta a reforma tributária, sua principal bandeira ao assumir o cargo. Tápias ficou dois anos e acabou saindo mais por suas virtudes, que circunstancialmente trombaram com as necessidades de caixa do governo. Ele tentou reduzir impostos, desonerar a produção, diminuir o chamado custo Brasil. Não teve êxito. Suas sugestões implicavam, num primeiro momento, redução na arrecadação federal. Tápias será substituído por Sergio Amaral, ex-porta-voz do governo e atual embaixador do Brasil em Londres. Muito provavelmente não se ouvirá falar do Ministério do Desenvolvimento por um bom tempo.
O nó que estrangula as exportações brasileiras desafia os analistas. A adoção do câmbio flutuante era apontada como a chave de ouro que abriria as portas do mundo para os produtos brasileiros. Finalmente adotado em janeiro de 1999, desvalorizou a moeda e tornou os produtos brasileiros instantaneamente mais baratos. E o que ocorreu com as exportações? Continuaram medíocres. Desde 19 de janeiro de 1999, o real já perdeu mais de 50% de seu valor em relação ao dólar, um incentivo que nenhum subsídio legal do governo aos exportadores poderia igualar. Ou seja, o custo de produção do empresário brasileiro em relação a competidores no exterior caiu pela metade. Se repassasse todos os ganhos para os custos, ele poderia estar vendendo o mesmo produto pela metade do preço. Isso na teoria. Na prática, nada aconteceu. Com todo o incentivo cambial, os empresários brasileiros continuam não conseguindo competir no exterior. Fica claro que o ganho cambial não era o gargalo. "O problema real é bem mais simples. A maioria dos empresários simplesmente prefere as comodidades do mercado interno, que exige muito menos deles, à competição internacional", diz Luiz Olavo Baptista, especialista em direito internacional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

Tombos históricos: acompanhe algumas das derrocadas mais impressionantes do mundo dos negócios






XEROX
Erros estratégicos fizeram o preço de suas ações cair de 64 para 9 dólares entre 1999 e 2001

FORD
Criou a linha de produção de automóveis, mas foi ultrapassada pela GM

MOTOROLA
Dominava o mercado na época dos pagers e celulares analógicos. Ficou para trás na era da tecnologia digital

APPLE
Inventou o computador pessoal, mas foi superada quando o mercado aderiu ao padrão Windows/Intel

OLIVETTI
Seus produtos, as máquinas de escrever, eram essenciais nos escritórios. Com a chegada dos computadores, a liderança evaporou-se

VOLKSWAGEN DO BRASIL
Chegou a ter mais de 50% do mercado brasileiro, mas hoje se encontra atrás da Fiat

COMPAQ
Perdeu a liderança na venda de PCs para a Dell, que apresentou uma proposta de venda pela internet mais eficiente

VARIG
Enrolada com dívidas, perdeu a liderança no mercado doméstico para a TAM neste ano

Queda de gigantes Compaq, Olivetti, Motorola... Será que agora é a vez de a Xerox deixar para sempre a liderança

Na lista das 500 maiores empresas americanas dos anos 50, pouco mais de uma dezena sobreviveu aos tempos ferozes da era Schumpeter e continua figurando no topo das versões mais atualizadas do ranking. No Brasil, o fenômeno se repete com a mesma intensidade. Gigantes do passado, como a Mesbla, que dominou o setor de lojas de departamentos no país até a década de 80, simplesmente evaporaram do mercado. Mudanças que ocorriam lentamente passaram a ser feitas em ritmo de corrida. Durante mais de quarenta anos, a Volkswagen do Brasil manteve uma inabalável e sonolenta liderança na indústria de automóveis nacional. No auge de seu domínio, em 1970, chegou a ter em mãos metade do mercado em número de veículos de passeio. Esses tempos ficaram definitivamente para trás. Nos últimos anos, a Fiat encostou na Volkswagen e passou a alternar com a concorrente a primeira posição. Mais recentemente, os italianos abriram uma vantagem inédita. Pela primeira vez na história, a Fiat permaneceu seis meses à frente da Volks. O critério utilizado para comparação é o total de veículos vendidos pela fábrica às concessionárias.
Na década de 40, o economista austríaco Joseph Schumpeter publicou uma tese sobre a "destruição criativa", em que defendia que o capitalismo evoluía a partir da seleção natural entre as empresas. De acordo com sua visão econômico-darwinista, as maiores companhias são como árvores que, um dia, precisam cair para que o sol faça crescer as plantas mais jovens. Segundo os analistas, o mundo atual dos negócios entrou definitivamente na "era Schumpeter". Gigantes como Motorola, Compaq e Volkswagen, entre outras, vão dormir líderes e, no dia seguinte, acordam em segundo ou terceiro lugar. Nunca a alternância de posições foi tão grande. Um dos maiores pesadelos do momento é o enfrentado pela Xerox. Numa época não muito distante, seu nome tornou-se sinônimo de cópia, tamanho era seu domínio sobre essa tecnologia. Chegou a ter 95% do mercado americano, mas parou no tempo e foi devorada pela concorrência japonesa. Hoje, encontra-se atrás da Canon nos Estados Unidos, e o preço de suas ações despencou de 64 para 9 dólares entre 1999 e 2001. Na semana passada, o conselho de administração empossou uma nova CEO, a executiva Anne Mulcahy. É o terceiro nome no comando da empresa nos últimos dois anos. Caberá a ela a tarefa de reverter o prejuízo de 281 milhões de dólares registrado somente no trimestre passado.
Segundo os especialistas, as mudanças ocorrem de forma mais lenta nos setores nos quais o que vale é a tradição. Nessa categoria estão bebidas, perfumes e cigarros, entre outros itens. Para manter a liderança no mercado de refrigerantes, a Coca-Cola não precisa preocupar-se em alterar as características do produto. Seus investimentos ficam concentrados em marketing e logística de produção e distribuição. Outros setores se modificam em função dos consumidores, quando eles demonstram cansaço por uma linha de produtos e querem experimentar novidades. Num certo sentido, os problemas da Volks no Brasil ocorrem em virtude desse fenômeno. Durante muito tempo, a montadora alemã pouco alterou o design de seus carros, apostando no conservadorismo dos motoristas. Depois que o padrão de consumo se alterou, a fábrica demorou a perceber a mudança. Existem ainda os setores em que as posições se alteram porque os produtos perdem o prazo de validade. Há vinte anos, as máquinas de escrever da Olivetti eram equipamentos imprescindíveis em todos os escritórios do mundo. Com a chegada dos microcomputadores, essa fase de pujança terminou abruptamente.
Mais do que qualquer um desses mercados, o de produtos tecnológicos é o que possui o ritmo mais vertiginoso de mudança. A Motorola virou um dos casos emblemáticos dessa nova era. Quando os pagers e os telefones celulares analógicos começaram a se popularizar, na década de 90, a companhia detinha 80% do mercado brasileiro. Seus anos de domínio duraram muito pouco. A tecnologia analógica foi substituída pela digital, mas a Motorola tardou a perceber o significado da transformação. E quando percebeu não conseguiu mais reassumir a posição original. Atualmente, contenta-se com 17% do mercado mundial de celulares e 40% no Brasil. Uma vez apeadas da liderança, as companhias têm dificuldades imensas em se recolocar. No passado, quando o ciclo de transformações não era tão intenso, algumas corporações podiam mudar completamente de ramo. A BMW, por exemplo, deixou a produção de motores de avião para se dedicar aos carros de luxo. A Remington fabricava armas e munições e tornou-se gigante no mercado das máquinas de escrever. Hoje, guinadas desse nível são raras.
Basta imaginar o dilema dos executivos da Olivetti quando os computadores começaram a se popularizar. Vista hoje, a decisão de manter a linha de produção soa idiota. Mas é preciso considerar que mudar de produto implicava sucatear o parque industrial da empresa. As lições deixadas pelas companhias que sobreviveram à seleção natural mostram que a versatilidade é, mais do que nunca, um fator decisivo para a manutenção da liderança. A gigante americana 3M é citada pelos especialistas como um exemplo. Presente nas mais diversas áreas, do setor odontológico à papelaria, investe pesado em pesquisa e desenvolvimento de produtos. A General Electric também está entre as vencedoras. Depois de apostar numa bem-sucedida política de diversificação (fabrica hoje desde lâmpadas até turbinas de avião), transformou-se nos últimos tempos numa das corporações mais lucrativas do mundo. Suas ações não são avaliadas apenas segundo o patrimônio e a projeção de lucros, mas também pelo potencial criativo para sobreviver às intempéries e mudanças do capitalismo moderno.